
Na Argentina da inflação galopante, pobreza e fome disparam; mais de 40% da população se encontra abaixo da linha da pobreza
Por Edmilson Pereira - em 2 meses atrás 293
A disparada da inflação e a crise econômica que vive a Argentina nos últimos anos jogou 40,1% dos argentinos na pobreza, segundo dados divulgados pela agência governamental de estatísticas, Indec. Desses, cerca de 9,3% passam fome. Os números representam um aumento frente aos 39,2% do segundo semestre de 2022 e 36,5% do primeiro semestre do mesmo ano, consolidando uma tendência de alta. Esses dados, porém, ainda não refletem os impactos da grande desvalorização do peso promovida pelo governo em agosto logo após o resultado das primárias eleitorais.
Ao todo, cerca de 11,8 milhões de pessoas vivem abaixo da linha da pobreza e mais de 2 milhões não conseguem ter o mínimo da cesta básica para sobreviver, em uma população de mais de 29 milhões. A média de renda das famílias foi de 124.071 pesos argentinos (R$ 1.789 no câmbio oficial, mas cerca de R$ 800 no paralelo, mais utilizado), enquanto o valor da cesta básica foi em média 199.593 pesos (R$ 2.878 no oficial, mais de R$ 1.300 no paralelo).
A pobreza cresce apesar da queda no desemprego, que está abaixo de 7% este ano, sinalizando que a causa reside na corrosão do poder de compra dos argentinos, cujos salários não acompanham os aumentos dos preços. O reflexo se vê na tradicional Plaza de Mayo, ponto turístico e de protestos, onde cada vez mais barracas surgem de pessoas buscando abrigo e comida.
Relatos de vítimas da crise na Argentina
Lionel Pais, 37 anos, contou à agência Associated Press que precisou se mudar para um abrigo em Buenos Aires há três semanas, logo depois de o governo ter desvalorizado o peso argentino em quase 20%, provocando outro aumento descontrolado nos preços. “Esses aumentos repentinos que ocorreram, a situação econômica do país, não me permitem cobrir minhas despesas básicas”, afirma.
Sebastián Boned, 26 anos, ligou para a linha direta de assistência para pessoas em situação de rua quando seu salário como recepcionista de hotel já não lhe permitia mais cobrir o aluguel em uma pensão. “É um lugar tranquilo”, disse ele sobre o abrigo. Mas seu tempo está correndo, já que os abrigos garantem moradia por apenas três meses. Durante esse período, os moradores recebem orientações sobre como encontrar trabalho e solicitar um subsídio para ajudá-los com o aluguel.
“A maioria deles diz que o seu salário não cobre as suas necessidades”, disse Mercedes Vucassovich, assistente social que dirige o Centro de Inclusão Social Bepo Ghezzi, no bairro Parque Patricios, em Buenos Aires, que viu sua demanda por moradia crescer.
Pobreza infantil
Onde esta pobreza mais se fez sentir foi entre as crianças de 0 a 14 anos, cuja taxa foi de 56,2%, acima dos 50,9% do semestre anterior. Entidades que trabalham com pobreza infantil, no entanto, alertam que o índice oficial ainda fica abaixo da realidade, já que não avalia o que se chama de “pobreza multidimensional”, que leva em consideração não só a renda, mas também a falta de acesso a saúde, educação e saneamento. Nesta lógica, o número de crianças em estado de pobreza passa de 60%.
Em Morón, um subúrbio a oeste da capital, María de los Ángeles García e Adrián Viñas Coronel, juntamente com os seus cinco filhos, com idades entre os 3 meses e 13 anos, alugam uma moradia improvisada num bairro de baixos rendimentos, depois de passarem seis meses nas ruas. Com um endereço, eles podem matricular seus filhos em uma escola pública.
O seu único rendimento fixo é de cerca de 90.000 pesos (R$ 1.297) por mês em assistência social, dos quais têm de destinar 25% para aluguel. “Temos que trabalhar o dia todo na rua porque não temos comida suficiente nem fraldas para as crianças”, disse García, 31 anos.
Fonte: Agência Estadão