
Racismo e bullying em escolas vão parar na Justiça e nº de ações cresce 100 vezes
Por Elison Silva - Em 5 dias atrás 345
Escolas e famílias são cada vez mais processadas na Justiça por casos de bullying ou racismo em estabelecimentos de ensino no País. Os dados dos tribunais mostram que cresceram mais de 100 vezes as ações que envolvem bullying entre 2020 e 2025 no Brasil. Não há números específicos sobre racismo, mas a percepção de alta é compartilhada por comunidades escolares e advogados.
A judicialização, segundo especialistas, aumenta por fatores que incluem novas leis – o bullying também foi tornado crime em 2024 – e maior conscientização. O que antes era silenciado, minimizado ou até entendido como brincadeira, agora é reconhecido como problema grave.
Também influenciam a insatisfação das famílias com as soluções das escolas e a repercussão de casos, sobretudo nas redes sociais. Além disso, na medida em que programas de inclusão avançam, aumentam os conflitos em espaços, muitas vezes elitizados, onde antes havia menos alunos ou educadores negros.
Já há escolas condenadas a pagar indenizações às crianças e aos pais delas pelo bullying cometido na rede privada ou pública. Entre os casos já sentenciados aos quais a reportagem teve acesso, os juízes determinam valores de R$ 10 mil a R$ 60 mil para as famílias. Em algumas ações, há o pedido de devolução das mensalidades.
Educadores, porém, ponderam sobre o desafio de lidar com os conflitos na escola, que não seguem a mesma lógica de punição de outros espaços, e dizem que judicializar não é resposta para todos os casos.
Em várias situações, não há unanimidade sobre expulsar o aluno que cometeu bullying ou racismo. Muitos especialistas defendem que ações antirrascistas ou para a convivência pacífica são parte da educação e são necessárias para que a criança não repita o erro.
Tabulação feita pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) mostra que em 2020 havia dois casos nos tribunais do Brasil ligados a bullying, violência e discriminação em escolas. O número cresceu ano a ano e em 2024 foram 280 ações. Até julho de 2025, havia registro de 211. A maioria está em São Paulo e no Rio Grande do Sul.
‘Meu ensino médio foi uma experiência horrível’
“Todo mundo fala que ensino médio foi a melhor fase da vida; o meu foi uma experiência horrível. Até hoje não consigo passar nem na porta da escola”, diz Alicia Leão, de 19 anos, que sofreu violências em uma escola particular de Campinas (SP). Ela foi diagnosticada com depressão severa e tentou suicídio.
Alicia é negra e recebeu bolsa aos 8 anos. Entre episódios de bullying, cyberbullying e racismo, teve os óculos quebrados diversas vezes, foi xingada e ameaçada de morte por um colega na adolescência.
A mãe, Andrea Rocha, buscou uma advogada só no último ano escolar após ver uma história parecida nas redes. “Eu procurava a escola, mas nunca fizeram nada, só diziam que minha filha estava segura”, conta. “Eu não sabia meus direitos e não queria dinheiro, só queria que o preconceito parasse”, conta ela, gerente numa empresa de congelados.
A ação contra o Colégio Dom Barreto e contra ex-colegas de classe começou em 2024 e ainda não foi concluída – ela pede indenização à escola e à família dos estudantes que teriam praticado as agressões. A escola é acusada de omissão.
Procurado, o advogado do colégio, Caio Ravaglia, afirma que “há anos são desenvolvidas ações interdisciplinares e específicas orientando e formando os discentes para convivência ética e pautada no respeito”.
Também diz que “a escola nunca soube das supostas atitudes das ex-funcionárias e, tão logo tomou ciência das hipotéticas atitudes indevidas dos colegas, apurou fatos e tomou as medidas cabíveis”. A reportagem procurou a defesa dos ex-alunos acusados, mas não obteve resposta.
Racismo é a discriminação por raça ou origem, enquanto bullying é um padrão de comportamento agressivo e repetitivo com diversas motivações. No entanto, é comum a sobreposição dos dois, caracterizando o racismo como a motivação do bullying, o que o torna um ato de violência coletiva. O racismo é um crime previsto em lei, enquanto o bullying é um crime específico, mas ambos causam sérios danos emocionais, psicológicos e físicos às vítimas.
Fonte: Estadão
Foto: Ilustração/Yan Krukov