Aluízio Bezerra

por Aluízio Bezerra - 7 anos atrás

O agente que mantém relação sexual com menor de 14 anos, por engano, incorre em erro do tipo?

Quando um homem mantém relações sexuais com uma pessoa menor de 14 anos de idade quando esta afirma ter idade maior, circunstância alimentada pela sua compleição física, fato previsível, se está diante de um erro do tipo, aquele em que o agente não sabe o que faz, mas sabe que a conduta é tida como crime, e, se conhecesse a realidade, não praticaria o ato.

Leciona Leonardo de Castro “A essência do erro de tipo, e o porquê de sua previsão expressa no Código Penal, em um rápido exemplo:

→ Em uma casa noturna, João, de dezoito anos, conheceu Marcela. Durante a conversa, Marcela disse a João ter dezesseis anos de idade. Após alguns drinques, o casal foi até a casa de João e manteve relações sexuais.

No caso acima, não houve a prática de qualquer crime. Apesar de a crença popular atribuir aos menores de dezoito anos a qualidade de intocáveis sexualmente, em verdade, a partir de quatorze anos, qualquer um pode decidir a respeito de sua vida sexual. Ou seja, a pessoa com quatorze, quinze, dezesseis ou dezessete anos pode consentir com a prática de atos sexuais, ainda que com alguém maior de dezoito anos, e não há nada de ilícito nisso.

Contudo, quanto aos menores de quatorze anos, o Código Penal os coloca em uma redoma. Pela atual redação, advinda da Lei 12.015/09, aquele que mantiver relações sexuais com uma pessoa menor de quatorze anos será responsabilizado penalmente, nos termos do art. 217-A do CP, pouco importando se o adolescente ou criança dedica-se à prostituição ou se já teve uma infinidade de parceiros.

Estupro de vulnerável
Art. 217-A. Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos:
Pena – reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos.

Voltando ao nosso exemplo, imagine que Marcela mentiu. Apesar de ter dito dezesseis anos, idade condizente com a sua estrutura física, ela, em verdade, tem somente treze anos. João, portanto, ao manter relações sexuais com Marcela, praticou, sem saber, o crime de estupro de vulnerável. Ele não sabia que estava fazendo sexo com uma pessoa menor de quatorze anos, mas, por erro sobre elemento constitutivo do tipo, praticou um dos fatos típicos previstos no Código Penal. Esta é a essência do erro de tipo: o agente não quer cometer a conduta tida como crime, mas, por falsa percepção da realidade, por erro sobre elemento constitutivo do tipo, acaba praticando conduta típica”.

Nesse sentido, veja os seguintes julgados:

APELAÇÕES CRIMINAIS. ACUSAÇÃO E DEFESA. CRIME DE ESTUPRO DE VULNERÁVEL. CERCEAMENTO DE DEFESA. DEFENSORA NOMEADA E DISPENSADA. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. DESCONHECIMENTO DA IDADE DA VÍTIMA. ERRO DE TIPO. ABSOLVIÇÃO. RECURSO DA ACUSAÇÃO JULGADO PREJUDICADO. Não havendo nenhum prejuízo ao acusado, em razão da desconstituição da defensora nomeada, não há que se falar em cerceamento de defesa. II – Comprovado nos autos que o relacionamento era consentido pela vítima, principalmente com a tácita aquiescência da mãe, não havendo lesão ao bem jurídico tutelado pelo tipo penal e efetiva dúvida quanto ao dolo do agente, por não restar claro que ele não tinha ciência da verdadeira idade da vítima, é de reconhecer o erro de tipo, que afasta o dolo, impondo a absolvição do acusado. II – Recurso interposto pelo Ministério Público julgado. ( TJ-GO – APELACAO CRIMINAL APR 02700211920148090028 (TJ-GO) – Data de publicação: 08/06/2017 – PRIMEIRA APELAÇÃO JULGADA PREJUDICADA. SEGUNDA APELAÇÃO CONHECIDA E PROVIDA)
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APELAÇÃO CRIMINAL. ESTUPRO DE VULNERÁVEL, SEQUESTRO QUALIFICADO POR TER SIDO PRATICADO CONTRA VÍTIMA MENOR DE DEZOITO ANOS E OCULTAÇÃO DE ARMA DE FOGO DE USO RESTRITO. SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DA DEFESA. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO. ACOLHIMENTO. CRIME DE ESTUPRO DE VULNERÁVEL. DESCONHECIMENTO DO RÉU ACERCA DA IDADE DA VÍTIMA. ERRO DE TIPO. CRIME DE OCULTAÇÃO DE ARMA DE FOGO DE USO RESTRITO. AUTORIA DA OCULTAÇÃO DO ARTEFATO NÃO COMPROVADA. CRIME DE SEQUESTRO QUALIFICADO. AUSÊNCIA DE PRIVAÇÃO DA LIBERDADE DA VÍTIMA. ATIPICIDADE DA CONDUTA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1. A PRÁTICA DE CONJUNÇÃO CARNAL COM PESSOA MENOR DE 14 (QUATORZE) ANOS DE IDADE CONFIGURA O CRIME DE ESTUPRO DE VULNERÁVEL, INDEPENDENTEMENTE DE TER HAVIDO CONSENTIMENTO DA MENOR. TODAVIA, DE ACORDO COM O ARTIGO 20 DO CÓDIGO PENAL , O ERRO PLENAMENTE JUSTIFICÁVEL SOBRE ELEMENTO CONSTITUTIVO DO TIPO LEGAL DO CRIME EXCLUI O DOLO E A CULPA. NO CASO EM EXAME, O APELANTE PROVOU QUE NÃO SABIA QUE A NAMORADA TINHA MENOS DE 14 (QUATORZE) ANOS DE IDADE, FATO ESTE CORROBORADO PELA PROVA TESTEMUNHAL COLHIDA. ASSIM, DEVE SER ABSOLVIDO QUANTO AO CRIME E ESTUPRO DE VULNERÁVEL, POR ERRO DE TIPO. 2. NÃO HAVENDO PROVAS SEGURAS ACERCA DA AUTORIA DA OCULTAÇÃO DA ARMA DE FOGO APREENDIDA, INCABÍVEL A CONDENAÇÃO DO APELANTE PELA PRÁTICA DO CRIME PREVISTO NO ARTIGO 16 DA LEI Nº 10.826 /2003. 3. NÃO TENDO A LIBERDADE DA VÍTIMA SIDO TOLHIDA, UMA VEZ QUE NÃO HÁ QUAISQUER PROVAS NO SENTIDO DE QUE A MENOR TENHA SIDO MANTIDA DENTRO DO SÍTIO DA FAMÍLIA DE SEU NAMORADO CONTRA SUA VONTADE, INCABÍVEL A CONDENAÇÃO DO APELANTE PELA PRÁTICA DO CRIME DE SEQUESTRO QUALIFICADO, PRATICADO CONTRA MENOR DE DEZOITO ANOS, DIANTE DA ATIPICIDADE DA CONDUTA. 4. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO PARA ABSOLVER O APELANTE QUANTO AOS CRIMES PREVISTOS NOS ARTIGOS 148 , § 1º , INCISO IV , E 217-A, AMBOS DO CÓDIGO PENAL , E DO ARTIGO 16 DA LEI Nº 10.826 /2003, COM FUNDAMENTO, RESPECTIVAMENTE, NOS INCISOS III , VI E VII DO ARTIGO 386 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL …. REJEITAR A PRELIMINAR. DAR PROVIMENTO AO RECURSO. MAIORIA. VENCIDO O REVISOR. 2ª Turma Criminal – (TJ-DF – APR APR 27421620118070010 DF 0002742-16.2011.807.0010 (TJ-DF) – Data de publicação: 16/03/2012)

PENAL – ESTUPRO – ABSOLVIÇÃO -NECESSIDADE – DESCONHECIMENTO DA IDADE DA VÍTIMA – ERRO DE TIPO – ARTIGO 20 DO CÓDIGO PENAL – RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1. Impõe-se a absolvição quando o apelante pratica a ação típica incorrendo em erro sobre circunstância elementar, o que afasta a tipicidade da conduta. 2. O error aetatis afasta o dolo e consequentemente a adequação típica da conduta. 3. Recurso provido. (TJ-MG – Apelação Criminal APR 10456060496985001 MG (TJ-MG) – Data de publicação: 10/03/2014)

Ementa: CRIMINAL. ART. 244-A DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE . CONFIGURAÇÃO. CLIENTE OU USUÁRIO DO SERVIÇO PRESTADO PELA INFANTE JÁ PROSTITUÍDA E QUE OFERECE SERVIÇOS. NÃO ENQUADRAMENTO NO TIPO PENAL. DESCONHECIMENTO DA IDADE DA VÍTIMA. AUSÊNCIA DE DOLO. RECURSO DESPROVIDO. I. O crime previsto no art. 244-A do ECA não abrange a figura do cliente ocasional, diante da ausência de “exploração sexual” nos termos da definição legal. II. Hipótese em que o réu contratou adolescente, já entregue à prostituição, para a prática de conjunção carnal, o que não encontra enquadramento na definição legal do art. 244-A do ECA , que exige a submissão do infante à prostituição ou à exploração sexual. III. Caso em que a adolescente afirma que, arguida pelo réu acerca de sua idade, teria alegado ter 18 anos de idade e ter perdido os documentos, o que afasta o dolo da conduta do recorrido. IV. A ausência de certeza quanto à menoridade da “vítima” exclui o dolo, por não existir no agente a vontade de realizar o tipo objetivo. E, em se tratando de delito para o qual não se permite punição por crime culposo, correta a conclusão a que se chegou nas instâncias ordinárias, de absolvição do réu. V. Recurso desprovido (STJ – RECURSO ESPECIAL REsp 884333 SC 2006/0192434-4 (STJ) – Data de publicação: 29/06/2007)

ESTUPRO – ABSOLVIÇÃO – NECESSIDADE -DESCONHECIMENTO DA IDADE DA VÍTIMA – ERRO DE TIPO – ARTIGO 20 DO CÓDIGO PENAL – Impõe-se a absolvição quando o apelante pratica a ação típica incorrendo em erro sobre circunstância elementar, o que afasta a tipicidade da conduta. RECUSO PROVIDO. TJ-SP – Apelação APL 00026815220088260360 SP 0002681-52.2008.8.26.0360 (TJ-SP) – Data de publicação: 16/05/2016)

ESTUPRO – ABSOLVIÇÃO – NECESSIDADE – DESCONHECIMENTO DA IDADE DA VÍTIMA – ERRO DE TIPO – ARTIGO 20 DO CÓDIGO PENAL – Impõe-se a absolvição quando o apelante pratica a ação típica incorrendo em erro sobre circunstância elementar, o que afasta a tipicidade da conduta. RECUSO PROVIDO. (TJSP – Orgão Julgador – 15ª Câmara de Direito Criminal – APL 00026815220088260360 SP 0002681-52.2008.8.26.0360 – Publicação – 16/05/2016 – Julgamento – 5 de Maio de 2016 – Relator Willian Campos)

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